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sexta-feira, 20 de abril de 2018

AS BASES NEUROCIENTÍFICAS DA PSICOTERAPIA


     Estamos no limiar de uma nova era da ciência do comportamento, e a psiquiatria moderna tem adotado uma postura pragmática em relação à dicotomia cartesiana que define corpo e mente como entidades separadas. 
     No final do século XIX, Darwin desenvolveu a teoria da evolução, que vem sendo confirmada pelos resultados dos estudos do genoma. Descobertas neurocientíficas recentes comprovam não só a plasticidade neuronal do cérebro humano como também a tendência natural do homem de adaptar-se ao meio, através de seu "kit de sobrevivência" afetivo. Na primeira metade do século XX, os tratamentos psiquiátricos eram polarizados em dois extremos: o grupo organicista, que recorria a tratamentos físicos, como o eletrochoque, e o psicanalítico, que via a psicanálise como uma espécie de panicéia universal. Durante quase todo o século, as duas posições foram tão antagônicas que se assemelhavam ao embate capitalismo versus comunismo.
     A queda dessa espécie de muro de Berlim ocorreu a partir dos anos 90, denominada "década do cérebro", quando houve enorme avanço das neurociências, principalmente com as descobertas das técnicas de imageamento cerebral. Isso nos fez chegar neste novo milênio ao paradigma da integração cérebro-mente na área da saúde mental, resultante de uma série de pequenas mudanças ocorridas durante a segunda metade do século XX, a começar pela descoberta da clomazina, em 1952, por Delay e Denicker, na França, introduzindo os psicofármacos no arsenal terapêutico. Também os questionamentos políticos/ideológicos/ teóricos levantados pelo movimento antipsiquiátrico na década de 60, em oposição aos tratamentos vigentes, inclusive o psicanalítico, acabaram por estimular uma reação nos Estados Unidos (posteriormente denominada "revolução científica da psiquiatria) que levou à elaboração de manuais de diagnóstico psiquiátrico com critérios objetivos que permitissem maior segurança na avaliação dos transtornos psiquiátricos e na indicação terapêutica (DSM-III e CID-10).
     Atualmente, após esse enorme progresso, é possível visualizar o cérebro em pleno funcionamento e de alguma forma monitorar "coisas etéreas", como pensamentos e sentimentos, com o uso de técnicas de imageamento cerebral. O neurocientista Eric Kandel, que recebeu o prêmio Nobel por pesquisas na área do funcionamento bioquímico cerebral, tem buscado encontrar paralelos entre os achados da neurociência e os construtos hipotéticos psicanalíticos. Para ele, "a psicanálise entra no século XXI com sua influência em declínio. Se a psicanálise preferir ficar em cima de seus feitos do passado, ela permanecerá uma filosofia da mente e uma literatura psicanalítica a ser lida como um texto filosófico moderno ou poético".
     Alguns poderiam interpretar como "tendência de o pêndulo balançar em direção à biologia" o fato de se explicar que um processo psicoterapêutico eficaz provoca mudanças no funcionamento cerebral através de alterações entre conexões neuronais. Entretanto, ao contrário, essa situação deve ser encarada como uma posição "pró-psicologia", já que é exatamente por meio de relações interpessoais que se alteram representações mentais. Precisamos "colocar de volta os neurônios nas neuroses") (Vaughan, S.1997), e a própria técnica psicanalítica, também conhecida como talking cure ("a cura pela palavra"), hoje pode ser explicada pelo conceito neurocientífico de "plasticidade neuronal". 
     O processo psicoterapêutico desencadeia mudanças no comportamento do paciente, o que inevitavelmente altera o funcionamento cerebral através de transformações nas conexões neuronais e daí a estrutura cerebral e o processo de consolidação da memória. Uma nova relação de apego modifica a memória processual implícita por meio de novas experiências de relação com o terapeuta.          A busca de um modelo neural dos mecanismos de memória baseia-se nos resultados de pesquisa indicando que o treinamento ou a experiência diferenciada leva a variações significativas na neuroquímica cerebral, anatomia e eletrofisiologia. Sendo assim, é geralmente aceito que a psicoterapia seja uma poderosa intervenção que afeta e modifica diretamente o cérebro. Desde 1992 a hipótese de que ela provoca modificações no funcionamento do cérebro vem sendo confirmada através de pesquisas com imagem. 

INTERVENÇÕES NO FUNCIONAMENTO CEREBRAL 

     Novas tecnologias, incorporando as recentes descobertas sobre o funcionamento do cérebro, principalmente os atuais estudos com PET scan (tomografia cerebral computadorizada por emissão de pósitrons) e ressonância magnética funcional, permitem analisar os efeitos não só das modernas medicações psicotrópicas como também das intervenções psicoterapêuticas no funcionamento cerebral. 
     Em 1992 foi feita a primeira pesquisa desse tipo (Baxter et al., 1992), repetida posteriormente (Schwatz et al., 1996). Esses trabalhos comprovaram a eficácia tanto da psicoterapia comportamental como do tratamento farmacológico com serotoninérgéticos no tratamento do transtorno obsessivo-compulsivo.
     Dados de imagem visual de ensaios clínicos com pacientes diagnosticados com transtorno de stress pós-traumático (TSPT), realizando avaliação pré e pós através de spect (tomografia computadorizada por emissão de fóton único) após terapia com EMDR (movimentos dos olhos para dessensibilização e reprocessamento), mostraram que, após esse tipo de procedimento, houve aumento de metabolismo pré-frontal e diminuição de ativação do sistema límbico (Van der Kolk, 1997). 
     Pesquisa sobre o resultado da psicoterapia cognitiva no trato de sintomas do transtorno de stress pós-traumático (Rauch et al., 1996) verificou, através de medições das mudanças do fluxo sanguíneo no cérebro realizadas por meio de PET scan, assimetria funcional com predominância de estimulação do hemisfério cerebral direito e ativação do córtex visual e desativação da área de Broca. 
     Esses dados corroboram a observação de que os pacientes com TEPT têm dificuldade de estruturar cognitivamente suas experiências traumáticas, tendendo a revivenciar a situação original como se estivesse ocorrendo naquele momento e a não verbalizar essas experiências. Após o tratamento, no qual os pacientes foram expostos a narrativas vivas e detalhadas de seus próprios traumas, os resultados do PET scan revelaram um retorno ao funcionamento do fluxo sanguíneo cerebral simétrico, com ativação da área de Broca.
     Estudo usando spect antes e após um ano de psicoterapia psicodinâmica num paciente bipolar, com exames  de imagem visual comparados com um paciente bipolar controle, que não recebeu nenhum tratamento, e com dez pessoas saudáveis controle mostrou que, no início, ambos os pacientes apresentavam diminuição do metabolismo de serotonina no córtex pré-frontal e tálamo, em comparação com os indivíduos normais e, que depois de um ano de psicoterapia, o paciente apresentou funcionamento serotoninérgico normal (Viinamaki H, Kuikka J, Tiihonnen J. et al, 1998).
Pacientes apresentando depressão maior, de acordo com a classificação DSM-IV, foram submetidos a 12 semanas de tratamento medicamentoso com antidepressivo serotoninérgico (paroxetina) ou com psicoterapia interpessoal e avaliados com PET scan no início e no final do tratamento na região do córtex pré-frontal e diminuição na região do lobo temporal, em comparação ao grupo de controle. Após 12 semanas, os pacientes apresentaram mudanças metabólicas em direção à normalização nessas regiões tanto com o tratamento medicamentoso quanto com o psicoterapeutico (Brody et. al., 2001).

por: Vera Lemgruber


Um comentário:

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